"Eu te busco de todo o coração; não permitas que eu me desvie dos teus mandamentos." (Salmo 119:10)

segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

Sobre frequência afetiva.

Ilustração de Blanca Gomez

Tudo começou com a leitura deste texto: Frequência afetiva, qual é a sua?

Há uma frase no meio do texto em que ele resume o conceito de frequência afetiva:
"A ideia de “frequência afetiva” a meu ver envolve muito de aceitar o que o outro tem pra te oferecer, mas principalmente o que ele não tem."

Outra parte do texto que me chamou bastante atenção foi a seguinte:

"A frequência também envolve o jeito de demonstrar afeto. No mundo também existe gente que “não gosta” de receber ou demonstrar afeto ou que não é de abraço, pior ainda se for demorado. Tem até gente que não lida bem com elogios. E essa negociação de espaços é muito importante. Saber colocar em prática a arte da empatia tentando entender e tolerar o outro da maneira como ele é, caso você faça questão da relação."

E ainda, para finalizar o copia e cola, o final do texto:

"Na vida conjugal as coisas ficam um pouco mais delicadas. Quanto menos expectativas sobre o seu par melhor. Mas e pra baixá-las? É difícil entender que existem parceiros que se esquecem de datas importantes ou namoradas que não sentem ciúme de você e pronto. Aceitar uma vida a dois tem muito de estarmos preparados para tudo o que não iremos receber. Você está preparado para não receber? Você está preparado para receber, só que não exatamente da forma que esperava? Você respeita a frequência afetiva dos outros?".

Algumas pessoas se questionaram ao ler o texto sobre "até que ponto o estar preparado para não "receber" é respeito ao outro?". Eu me perguntei, sem querer ser pedante, mas já sendo, é: e como achar que em algum momento, não estar preparado para não receber pode ser desrespeitoso ao outro? Ou, ao inverso: como estar sempre preparado para receber pode respeitar o outro? Quando a gente se prepara para não receber e, mais ainda, quando a gente não pede pelo o que tem em troca, nem "cobra", é um ato de respeito e mais que isso, amor. É não colocar em cima do outro o peso de uma carga difícil que é a de "corresponder sempre à expectativa do outro". Não há nada mais pesado do que se sentir meio que numa "obrigação" de responder ao outro porque o outro é legal, é seu amigo... Para mim, uma relação de amizade não é uma relação de "troca", por mais que seja de amor, carinho, respeito... Estamos falando de humanos não de uma relação cambial, qualquer relação humana que se denomine amizade, deve ser colocada sob a doação. Você doa amor, carinho, respeito. E respostas. E sobre a resposta, ou reciprocidade, como alguns chamam. Nem sempre elas vêm da forma como achamos que virão. Mais um detalhe para nos atermos.

Houve também o questionamento, a partir do texto, sobre o desrespeito a si próprio. Não sei como parece isso a cada um, mas... Então, aceitar que nem sempre o outro vai me responder da forma como desejo ou acho que deve ser respondida é de certa forma me desrespeitar? Isso me pareceu tão paradoxal... Uma linha tênue sobre: me desrespeitar ou desrespeitar o outro? Não respeitar o outro se isso me desrespeitar?

Primeiro, fico me perguntando o que é desrespeitar a si próprio? Ok, somos seres egoístas, sempre queremos que o outro de alguma forma responda, o nosso grande problema é que consideramos que: isso é da nossa natureza, portanto, isto é certo ou bom. Acho que quanto mais nos livramos mais disso, mais livres somos. De verdade. Quanto mais nos livramos de querer reciprocidade sempre, melhor as coisas chegarão: amaremos por amar, doaremos por doar, seremos amigos por ser.

Falar que tudo fica melhor quando se tem reciprocidade e dizer que não pode ser um aprisionamento de cobranças e torturas sentimentais é algo que vai ser praticamente impossível acontecer. Porque doar não tem nada a ver com reciprocidade. Você doa porque você acredita, e mais vazio ficamos é quando doamos na intenção de ver frutos, e não pela beleza de doar em si.

Acho que isso, no cristianismo, por exemplo, é uma das coisas mais difíceis de se entender:

"Então Jesus disse aos seus discípulos: "Se alguém quiser acompanhar-me, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me." Mateus 16:24

A primeira coisa que Jesus pede é o "negue-se". O quanto difícil é negar-se! Saber que: sim, preciso da afirmação do outro, preciso do outro, preciso que ele me responda, MAS... Não posso exigir dele. Não posso classificá-lo por causa disso. Não posso sequer julgá-lo apesar de ele sumir por uns 4 anos. O negue-se a si mesmo é a coisa mais difícil. É não exigir reciprocidade. É ficar livre dessa "necessidade" que é ter a de querer que o outro supra as nossas expectativas. Isso é servir também, fazer pelo bem de se fazer, independente do que venha.

Ok, eu falo isso tudo sob o ponto de vista de uma pessoa de frequência afetiva baixíssima. Sou dessas que some por um tempo, mas que também aparece de repente. Mas, por experiência própria, sofri bem menos, comigo mesmo e por causa dos outros, quando parei de esperar ou exigir qualquer coisa, faço porque quero, porque gosto, se não der, não deu. Se der, deu. O importante é COMO, não a frequência. Porque se a gente parar para refletir bem: quando começamos a dizer que tudo precisa de reciprocidade, partimos de um pressuposto (nosso) do que seria uma atitude recíproca do outro para conosco. Ou seja, já estamos colocando um a priore acerca do que o outro pode/deve me oferecer em troca para que sinta que há então uma relação recíproca. E nem sempre o outro responde na mesma medida.

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